Da deriva dos continentes à tectónica das placas


O desejo de expansão dos povos implicou ine-vitavelmente o aperfeiçoamento dos mapas nos quais procuravam representar o mundo que os rodeava. À medida que estes mapas se aproximavam mais daquilo que hoje sabemos ser a realidade, uma perturbadora semelhança se ia revelando… as linhas de costa de ambos os lados do Atlântico pareciam adaptar-se de um modo tão perfeito que seria difícil não pensar que outrora tivessem estado unidas. Tratar-se-ia de uma simples coincidência ou, pelo contrário seria a expressão de algum processo que actuaria à escala do próprio planeta?

PangeiaSe as representações mostrando os continentes unidos começam a surgir já no século XIX, só no século XX, mais precisamente a partir de 1915, estas propostas ganham um suporte científico com os trabalhos de Alfred Wegener. Com efeito, deve-se a este meteorologista alemão a procura de evidências a favor da existência de um antigo super continente, que não se limitassem apenas a meras considerações geométricas. Pangeia foi o nome que deu a esse super continente.

A maioria dos argumentos apresentados por Wegener partia do princípio de que, se os continentes já tinham estado unidos então a sua separação teria isolado rochas e seres vivos que anteriormente estavam em continuidade. Uma das evidências que então apresentou baseava-se num réptil extinto há mais de 250 milhões de anos, denominado Mesosauros. Fósseis deste género apenas são encontrados no Brasil e na África do Sul o que, aliado ao facto de se tratar de um réptil de água doce, parecia provar que o oceano Atlântico teria que ter menos de 250 milhões de anos de idade. Considerações semelhantes, feitas em torno de uma planta terrestre também já extinta, a denominada Glossopteris, permitiam mostrar que não só a América do Sul e África tinham estado juntas mas que essa continuidade tinha que ser alargada à Antártida, Índia e Austrália.

Complementando os dados anteriores Wegener mostrou que, quando se marcava na Pangeia a localização de rochas que poderiam ser utilizadas como indicadores climáticos e que apresentavam uma idade variando entre cerca de 300 e 250 milhões de anos, as mesmas se distribuíam segundo bandas aproximadamente paralelas. Esta regularidade, que seria de esperar em termos de zonamento climático em qualquer altura do passado do nosso planeta, perdia todo o sentido se os continentes sempre tivessem mantido as posições que apresentam actualmente.

Apesar das evidências apresentadas por Wegener não deixarem margem para dúvidas de que, pelo menos desde há cerca de 250 milhões de anos a Terra teria sofrido um processo por ele designado de deriva continental, a inexistência de um mecanismo que permitisse explicar a movimentação dos continentes e a aparente impossibilidade física da sua deslocação, levou a generalidade da comunidade científica a rejeitar violentamente tal possibilidade.

Durante a 2ª Guerra Mundial a importância de que se revestia a localização de submarinos inimigos bem como a necessidade da procura de novos recursos minerais levou ao desenvolvimento de uma série de tecnologias que, de um modo geral, podemos considerar dentro do grupo da prospecção geofísica. A aplicação destas metodologias, bem como trabalhos complementares, rapidamente se traduziram pela acumulação de numerosos dados geológicos e geofísicos. Os resultados obtidos, não só evidenciaram o profundo desconhecimento que o Homem tinha até então dos fundos oceânicos, como também implicaram uma nova forma de ver o funcionamento do nosso planeta.

Os Novos DadosRelevo- Oculta por cerca de 5 000 metros de espessura de água dos oceanos situa-se a maior cadeia de montanhas da Terra. As denominadas dorsais oceânicas, com os seus quase 4 000 metros de desnível, dominam a topografia dos principais oceanos formando uma rede anastomosada possível de seguir por mais de 50 000 km de comprimento. É de realçar a tendência para estas cristas se disporem paralelamente ao alongamento dos oceanos ocupando aí uma posição mediana, situação que é particularmente clara a nível do Atlântico.

Composição- Ao contrário dos continentes que apresentavam uma constituição geológica variada, onde todos os grupos (rochas sedimentares, ígneas e metamórficas) aparecem bem representados, os fundos oceânicos apresentam uma grande monotonia no que diz respeito à sua composição, apresentando-se constituídos quase que exclusivamente por basaltos.

Modernidade- Contrastando fortemente com os continentes onde as rochas chegam a ter quase 4 000 milhões de anos, nos oceanos a sua idade não vai além dos 170 milhões de anos. Por outro lado, a distribuição das idades dos fundos oceânicos mostra ainda uma clara simetria em torno da crista média; rochas sucessivamente mais antigas vão sendo encontradas à medida que nos afastamos destes grandes relevos submarinos.

Anomalias magnéticas- Ao longo da história da Terra o campo magnético terrestre sofreu inversões periódicas durante as quais a polaridade se invertia. Os estudos de paleomagnetismo dos fundos oceânicos mostram-nos que a distribuição das rochas com polaridade normal e invertida se faz em bandas alternantes dispostas paralelamente às dorsais oceânicas.

Tectónica das Placas, uma teoria unificadora - Os elementos anteriores levaram à formulação na década de sessenta do chamado modelo da expansão dos fundos oceânicos, o qual defendia que os fundos oceânicos são continuamente criados nas dorsais oceânicas por vulcanismo ao longo de fracturas existentes na parte central das dorsais. Por outro lado, num planeta que mantém sempre um volume constante, a expansão dos fundos oceânicos tem que ser contrabalançada por um processo que leve ao consumo do excesso de área formada. Estas regiões onde, os basaltos oceânicos mais antigos mergulham de novo para o interior da Terra, foram descobertas na mesma época, tendo sido denominadas zonas de subducção.

Os novos conhecimentos permitiram a elaboração da teoria da tectónica de placas, a qual acaba por ser uma síntese da deriva continental de Wegener com a expansão dos fundos oceânicos. De acordo com este modelo os fundos oceânicos são continuamente reciclados por um processo de criação de crusta oceânica nas dorsais e consumo nas zonas de subducção. Embora este processo seja complexo, as forças que o provocam são essencialmente as diferenças térmicas existentes no interior da Terra. Estas diferenças desenca-deiam fenómenos de convecção na astenosfera e na mesosfera que acabam por induzir a movimentação das grandes placas litosféricas que constituem a superfície da Terra. Os fenómenos de convecção são desencadeados sempre que existem diferenças de temperatura entre duas regiões de um corpo; é, por exemplo, o que acontece com um líquido a ferver.